Redesignação Sexual: o que você precisa saber antes de considerar a transição
A história de conquistas de pessoas transgêneros no Brasil é muito recente e ainda tem muito o que caminhar. Mas, nos últimos anos, alguns avanços foram feitos: desde 2006, o nome social é aceito pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para travestis e transexuais; desde 2008, as cirurgias de Redesignação Sexual também podem ser realizadas pelo sistema. E, mais recentemente, em 2018, a troca de documentos para o nome social em cartório pode ser feita sem a comprovação da Redesignação Sexual ou sem uma ordem judicial.
Se você está ponderando fazer a cirurgia de Redesignação Sexual, saiba que esse é um dos últimos passos até a transição de gênero. Ela começa com um longo processo de tratamento hormonal, além de acompanhamento psicológico para que tudo seja realizado com segurança.
Apesar de as terapias hormonais serem, em sua maioria, reversíveis, a cirurgia de Redesignação Sexual é uma opção para a vida toda. Por isso, a decisão deve ser tomada levando em consideração todas as consequências relativas à sua saúde física e mental. Neste post, apresentamos como é feita a cirurgia de Redesignação Sexual e o que você precisa saber antes de tomar a decisão.
Terapia hormonal: o primeiro passo
O processo de transição de gênero tem início com a terapia hormonal, por meio da qual a pessoa faz uso de medicamentos hormonais, muito similares aos produzidos naturalmente pelo corpo: estrogênio e testosterona. No caso de mulheres trans, os hormônios deixarão a aparência mais feminina, geralmente distribuindo a gordura corporal nos quadris, reduzindo a massa muscular, enfraquecendo os pelos corporais e faciais, podendo causar ainda sensibilidade nos seios e redução do tamanho do pênis e dos testículos. O tratamento deve ser realizado por um profissional com experiência em terapia hormonal (endocrinologista ou ginecologista ou urologista especializados). E, a fim de que mantenha os efeitos do estrogênio, os medicamentos deverão ser usados pelo resto da vida.
Caso a sua intenção seja também modificar o aparelho genital, o próximo passo é buscar acompanhamento psicológico e psiquiátrico específico antes de se submeter à cirurgia de Redesignação Sexual. O procedimento é uma cirurgia realizada por uma equipe multidisciplinar que vai transformar o pênis em uma neovagina, que permita o intercurso sexual.
Como é feita a cirurgia de Redesignação Sexual para mulheres trans?
A cirurgia de Redesignação Sexual para mulheres trans consiste em realizar a técnica de inversão peniana modificada. Com tal propósito, são feitas incisões na região perineal, demarcando a região em que estará a neovagina. Em seguida, o pênis é dividido ao meio, e a pele, invertida, com o objetivo de que seja constituído o introito vaginal e a neovagina, deixando a uretra, a pele e as terminações nervosas que garantem sensibilidade à região. Os testículos também são removidos, mantendo o escroto, cuja pele ajudará a formar os lábios vaginais e o introito vaginal. Então, um espaço de cerca de 15cm para abrigar a neovagina entre o reto e o ânus é confeccionado com a fixação da pele invertida do pênis próximo à base da próstata.
Posteriormente, o aparelho urinário é adaptado com a realização de uma uretrostomia e uma plástica para a formação do clitóris.
Em geral, no pós-operatório, são realizadas dilatações sequenciais que permitam manter o diâmetro do canal vaginal. A recomendação é que as atividades sexuais sejam retomadas apenas após 4 meses depois da cirurgia, a fim de garantir a correta recuperação e cicatrização da região. O ideal é que elas sejam feitas mediante o uso de lubrificante. O paciente deverá ainda realizar acompanhamento tanto com ginecologista quanto com urologista, já que a próstata não é removida no ato cirúrgico.
Trata-se de um procedimento complexo, realizado por equipes cirúrgicas multidisciplinares com riscos. Contudo os resultados finais são muito animadores, permitindo na maioria das vezes atividades sexuais e uma satisfação muito grande no que concerne à elevação da autoestima dos pacientes.
Quais são os riscos da Redesignação Sexual?
Embora a terapia hormonal seja relativamente segura, é importante saber que a administração dos medicamentos pode, sim, ter efeitos colaterais. Para quem faz uso do estrógeno, isto é, hormônio feminino, esses efeitos podem ser:
– Trombose
– Embolia pulmonar (bloqueio de um vaso sanguíneo nos pulmões)
– Alteração da função hepática
Já o principal risco envolvido na cirurgia de Redesignação Sexual é a sua indicação inapropriada ou precoce, levando ao arrependimento. Isso ocorre muitas vezes quando a pessoa ainda não está certa em relação a sua decisão, apresenta instabilidade emocional ou dificuldades de lidar com a própria sexualidade. Por esse motivo, é exigido que o candidato à cirurgia tenha vivência mínima de dois anos no gênero com o qual se identifica.
Além disso, a infertilidade é uma das consequências que a pessoa que deseja passar pela transição de gênero deve considerar antes de iniciar o processo. O quadro de infertilidade tem início durante a terapia hormonal, uma vez que os hormônios masculinos produzidos naturalmente pelo organismo são substituídos pelos hormônios femininos, e se torna definitivo em casos de cirurgia de Redesignação Sexual.
Isso não significa, no entanto, que o indivíduo tenha de abandonar seu planejamento familiar. Ao entender que a infertilidade é uma das consequências que deverá enfrentar a partir de sua determinação, você pode optar pela Criopreservação de seu material biológico, o sêmen, que poderá ser mantido por quantos anos forem necessários até que você tome a decisão de se tornar pai/mãe. O processo é simples e confiável.
Quer entender melhor como funciona a Criopreservação de Sêmen? Confira este post em que detalhamos o passo a passo do processo.
ANTONIO PEIXOTO DE LUCENA CUNHA – UROLOGISTA, PROFESSOR DA FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DE MINAS GERAIS MESTRADO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE NA FCMMG